Cooperativas: Tire suas dúvidas sobre cooperativas habitacionais 

Com a estabilização da economia, as famílias brasileiras recuperaram o poder de controlar seu orçamento e, naturalmente, de planejar iniciativas como a aquisição de moradia, o maior sonho da maioria dos cidadãos.

Dentro dessa realidade positiva, ressurge com especial destaque para a aquisição da casa própria: as Cooperativas Habitacionais. Um sistema que proporciona oportunidades concretas, mas que exige análises por parte de quem adere ao sistema.

Em face desse novo contexto, quatro entidades do setor no Estado de São Paulo – Abicoop, Secovi-SP, Sincooesp e SindusCon-SP, inspiradas no espírito de atuação transparente e democrática a que se propõe o sistema cooperativado, elaboraram o presente “ Manual de Orientação – Programa de Cooperativas Habitacionais”. O principal objetivo é orientar futuros cooperativados e administradores de cooperativas, esclarecendo alguns requisitos básicos. Alguns deles são exigidos por lei e outros são de suma relevância para propiciar segurança e tranqüilidade ao sucesso dos futuros empreendimentos habitacionais. Observados tais requisitos, os que pretenderem aderir ao sistema cooperativo terão maior certeza de estar no caminho certo.


O COOPERATIVISMO

O cooperativismo caracteriza-se por uma associação de pessoas que, unidas, conjugam esforços para a obtenção de um fim, sem qualquer objetivo de lucro.

No Brasil, a Lei 5.764, de 16 de dezembro de 1971, define a Política Nacional de Cooperativismo.

Entre as várias espécies de cooperativas, a habitacional se caracteriza pela união de pessoas cujo objetivo comum é a aquisição da casa própria a um baixo custo, na qual a prestação dos serviços é feita exclusivamente em favor dos cooperados.

Se você pretende ingressar numa cooperativa, siga atentamente as recomendações.


O QUE FAZER ANTES DE INGRESSAR NUMA COOPERATIVA

Verificar se a Cooperativa:

» Cumpriu todos os atos jurídicos para a constituição e funcionamento, e, em especial, se sua proposta está de acordo com os atos cooperativos previstos no seu Estatuto, conforme Lei 5.764/71. Confira, por exemplo, se existe de fato um Estatuto da Cooperativa e se o mesmo foi aprovado em assembléia dos membros;

» Está registrada na Junta Comercial do Estado de São Paulo ( Jucesp );

» Está inscrita no CGC do Ministério da Fazenda;

» Possui sede e/ou local de atendimento ao associado, com pessoas devidamente preparadas;

» Dispõe de estrutura técnica adequada, ou de um Órgão Assessor de reconhecida capacidade técnica especializada, e com experiência na área habitacional. Procure informar-se cobre a empresa que assessora a cooperativa, sua experiência no mercado e seu currículo.

Além disso, é altamente recomendável que a Cooperativa esteja:

» Inscrita no Cadastro da Ocesp – Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo;
» Filiada ao Sincooesp – Sindicato das Cooperativas do Estado de São Paulo.

Outras recomendações:

A cooperativa deverá apresentar, sempre que solicitada, as certidões negativas de protestos, dos distribuidores forenses, da Justiça Federal e de impostos municipais. Se houver ações ou protestos, procure esclarecer devidamente o assunto junto à diretoria da Cooperativa ou ao Órgão Assessor. Solicite informações sobre as providências tomadas para sanar os problemas.


O que a Cooperativa Habitacional precisa fazer

A Cooperativa deverá:


» Promover empreendimentos habitacionais em terrenos definidos, com documentação regular e previamente analisados quanto a viabilidade técnica. O Órgão Assessor ou a construtora contratada devem prestar a esse respeito todas as informações necessárias, sempre que solicitadas;

» Informar ao interessado a localização e demais condições do terreno onde será realizado o empreendimento habitacional;

» Apresenta a ficha técnica ( ou equivalente ) emitida pela Prefeitura, comprovando que a área é adequada àquele empreendimento;

» Contratar para a execução das obras uma construtora idônea, séria e com experiência na construção de conjuntos habitacionais;

» Informar ao cooperativado as condições de aquisição do terreno, bem como manter à disposição a documentação correspondente à mesma;

» Verificar no Cartório de Registro de Imóveis se o terreno onde será executado o empreendimento apresenta ônus, ou seja, se há fato impeditivo para sua livre aquisição e utilização;

» Fornecer informações precisas sobre o plano habitacional e as condições de contratação da obra, acompanhadas de planta do apartamento ou casa e suas áreas, e de planta que mostre a implantação das construções sobre o terreno. Fornecer também o memorial descritivo, documento que detalha a construção e os acabamentos do empreendimento;

» Definir se o contrato de construção da obra com a construtora será PREÇO FECHADO ou a PREÇO DE CUSTO. Observe as diferenças entre as duas modalidades de contratação:

Preço Fechado: quando o preço de construção é, desde o início, fixado no contrato ( com os correspondentes reajustes e correção monetária );

Preço de Custo: quando o preço de construção for apurado no final da obra, conforme variarem seus custos. Neste caso, haverá um preço inicial estimado, que poderá variar, para mais ou para menos, em conformidade com os custos das obras.

- Se for PREÇO FECHADO, informar as condições de reajuste das parcelas;

- Se for PREÇO DE CUSTO, informar se há limite máximo de variação do preço inicialmente estimado, devendo isto constar do contrato assinado entre a Cooperativa e a construtora e do Termo de Adesão firmado entre o Associado e a Cooperativa.


NOTA: é recomendável que o contrato de construção e o memorial descritivo estejam registrados no Cartório de Registro de Títulos e Documentos e disponíveis no local de atendimento da Cooperativa, permitindo-se a qualquer interessado tomar conhecimento das condições construtivas do imóvel.

 

Cooperativas habitacionais: requisitos essenciais para sua constituição e existência legal

LUÍS PAULO SIRVINSKAS*

 

 

As cooperativas habitacionais têm sua previsão legal no artigo 5º, inciso XVIII, da Constituição Federal. Este dispositivo determina que sua criação se dará na forma da lei, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento.

Vê-se, pois, que as cooperativas não estão sujeitas a nenhuma fiscalização ou controle do Estado.

E como não há nenhuma fiscalização, necessário se faz que os cooperados integrem o órgão de administração para realizar o controle de fato dessas cooperativas, fiscalizando-as.

É comum, no entanto, que seus Estatutos Sociais sejam arquivados na Junta Comercial e registrados na OCESP (Organizações das Cooperativas do Estado de São Paulo) para dar conhecimento ao público em geral de sua existência legal.

A criação de cooperativas visa, por um lado, tentar suprir o déficit habitacional e, por outro, permitir que determinado grupo de pessoas possa se reunir para a aquisição da tão almejada casa própria pelo preço de custo.

Desta forma, um grupo inicial de pessoas interessadas se reúne com o intuito de adquirir sua casa própria (na praia, no campo ou na cidade). E por não possuir conhecimento técnico, o grupo poderá contratar um órgão assessor para a criação da cooperativa. Este órgão fica responsável por todo o processo burocrático da constituição da cooperativa, bem como pela elaboração do projeto e inscrição de novos cooperados.

Realizada a compra do terreno, elaborado o projeto, estipulado o valor das parcelas, escolhida a construtora do imóvel e assinado o contrato individual com cada um dos cooperados, convoca-se a primeira Assembléia Geral para ratificar os atos praticados pelos fundadores, nomeando-se, em seguida, o Órgão da Administração e o Conselho Fiscal e seus suplentes.

Note-se que só poderão fazer parte do Órgão da Administração e do Conselho Fiscal cooperados que tenham adquirido suas quotas-partes da cooperativa.

Cumpridos todos estes trâmites, o cooperado passa a sócio da cooperativa.

A legislação infraconstitucional traz uma série de benefícios tributários às Cooperativas Habitacionais.

Trata-se de verdadeiras isenções ao direito de tributar. Isto faz com que o preço do imóvel, via de regra, seja cinqüenta por cento inferior a um outro imóvel vendido, nas mesmas condições, por uma incorporadora. Assim, todo o benefício legal deve ser repassado aos cooperados por intermédio das parcelas.

A Cooperativa não pode auferir lucro. Tal prática é vedada expressamente pelo art. 3º, da Lei nº 5.764/71.

Ao ingressar em uma Cooperativa Habitacional, o interessado deverá fazer uma pesquisa na Junta Comercial, na OCESP, verificar a idoneidade do Órgão Assessor e da construtora responsável pela obra e retirar certidões cíveis e criminais dos membros que compõem o Órgão de Administração.

Há necessidade também de se verificar se a cooperativa fixou o preço de custo de cada unidade autônoma, comparando-o com outros imóveis na região.

Ressalte-se ainda que noventa por cento das Cooperativas Habitacionais de São Paulo não são verdadeiras cooperativas por não preencherem os requisitos legais previstos na Lei nº 5.764/71.

E por detrás destas cooperativas estão empresários e incorporadoras praticando atos de comércio com intuito de auferir lucro,

:beneficiando-se das isenções tributárias.
Trata-se de Cooperativas de fachada.

O cooperado ou o interessado poderá, por si só, constatar se a Cooperativa é verdadeira ou não, bastando, para tanto, verificar se estão presentes os seguintes requisitos legais:

a) verificar se a fundação da Cooperativa foi constituída por cooperados. Cooperado é aquele que adquiriu uma quota-parte da Cooperativa através de Instrumento Particular de Termo de Adesão e Compromisso de Participação em Programa Habitacional.

O Cooperado torna-se sócio da Cooperativa limitada ou ilimitadamente. Neste último caso, o Cooperado responde, em caso de insolvência da Cooperativa, pelos seus bens pessoais, se a dívida for superior ao patrimônio da Cooperativa.

Se limitada, o cooperado responde apenas pelas quotas-partes subscritas. Há necessidade também da realização de uma Assembléia Geral de constituição para se eleger o Órgão da Administração e do Conselho Fiscal.

Como já disse anteriormente, estes órgãos só podem ser preenchidos por Cooperados e não por pessoas estranhas (art. 47, da Lei nº 5.764/71).

Também não podem fazer parte deste órgão pessoas que possuam vínculos com a Construtora ou com empresas fornecedoras de materiais de construção.

Além disso, a Assembléia Geral Ordinária deve ser convocada anualmente até o terceiro mês de cada ano para discutir os seguintes assuntos: prestação de contas; relatório da gestão; balanço; demonstrativo das sobras apuradas e/ou perdas; destinação das sobras; eleição de componentes dos Órgãos; dentre outros assuntos pertinentes (art. 44, da Lei nº 5.764/71);


b) verificar se o Cooperado ingressou na Cooperativa e se subscreveu suas quotas-partes do capital social. Sem a subscrição das quotas-partes do capital social pelos Cooperados, eles não se tornam associados da Cooperativa, não havendo que se cogitar desta forma jurídica, cuja existência pressupõe a participação societária de todos os Cooperados, como donos que são da Cooperativa (In trabalho inédito sobre Cooperativas Habitacionais e algumas considerações sobre Associações, de autoria da Dra. Dora Bussab Castelo, p. 25); e c) verificar se foi criado, pelos Estatutos, os três Órgãos da Administração, ou seja, o Conselho de Administração, a Diretoria e o Conselho Fiscal. Somente as Assembléias (Ordinária ou Extraordinária) têm poderes soberanos para tomar todas as decisões atinentes à Cooperativa, especialmente para eleger e destituir o Órgão da Administração.

As Assembléias não só devem existir formalmente, como efetivamente se realizar, e ser controladas, a nível das decisões a serem tomadas, pelos próprios cooperados (Idem, p. 25). Ressalte-se, mais uma vez, que os membros dos Órgãos de Administração devem ser Cooperados eleitos que efetivamente tenham adquirido imóveis pelo sistema de Cooperativa.

Se estes requisitos básicos não estão sendo respeitados, não se trata de uma verdadeira Cooperativa.

Acresça-se também que a Cooperativa, além de ser beneficiada pela isenção de diversos tributos, também está dispensada do registro prévio no Cartório Imobiliário da Incorporação Imobiliária.

Ressalte-se ainda que cinqüenta por cento dos lançamentos imobiliários em 1996 foram realizados por Cooperativas Imobiliárias.

O preço do imóvel lançado por uma Cooperativa Habitacional é substancialmente abaixo da do mercado, chegando a cinqüenta por cento do preço de um imóvel, nas mesmas condições, lançado por uma Incorporadora.

Essa informação é do Vice-Presidente da Secovi, Sr. Walter Lafemina.

Comparei os contratos de duas Cooperativas Habitacionais e verifiquei total dissemelhança: uma delas respeita as normas legais e a outra não; uma delas vende o imóvel pelo preço acima da do mercado e a outra pelo preço de custo; uma adota, após a entrega das chaves, a tabela price e o índice IGP-M para atualizar as parcelas e a outra fixou suas parcelas com base no custo da obra; para uma as atividades da Cooperativa se encerram com a entrega das chaves e a outra com o pagamento da última parcela; no contrato de uma delas há várias cláusulas nulas de pleno direito e a outra não; uma contratou empresa externa para realizar a comercialização das unidades e a outra realizou a venda diretamente aos cooperados.

Estas são algumas cautelas que o interessado deve observar antes de se inscrever em uma Cooperativa Habitacional para se evitar futuros problemas.

Contudo, se o cooperado constatar que a Cooperativa não vem respeitando as normas legais ou se a construtora está em atraso com a entrega da obra ou se o preço do imóvel é superior ao do mercado, qualquer cooperado poderá convocar uma Assembléia Geral para destituir o atual Órgão de Administração e eleger um outro e, se for o caso, afastar a Construtora em questão. Caso não seja afastada a Construtora, deve ela pagar uma multa diária pelo atraso na entrega do empreendimento.

Em seguida, contrata-se uma Consultoria e elabora-se uma nova planilha de custo da obra e divide-se o valor apurado, proporcionalmente, aos Cooperados, fazendo-se um aditivo ao contrato para reduzir o valor.

Em havendo resistência por parte da direção da Cooperativa, resta propor Ação Civil Pública, visando à declaração da Despersonalização da Personalidade Jurídica da Cooperativa ou a sua perfeita adequação às normas legais do Cooperativismo, respondendo, ainda, a Diretoria, caso seja julgada procedente a citada ação, pelos crimes praticados até então (Sonegação Fiscal, Estelionato, Economia Popular e Defesa do Consumidor).

Esclareça-se, também, que todo Cooperado tem plena liberdade de se associar a qualquer entidade e dela sair sem qualquer obstáculo que dificulte esta saída.

O Cooperado que quiser se desligar da Cooperativa poderá fazê-lo e receber integralmente o valor pago até então corrigido pelo mesmo índice aplicado pela Cooperativa. Se assim não for, estaria a Cooperativa se enriquecendo ilicitamente do valor retido a título de despesas.

Tais cautelas devem ser observadas pelo interessado, antes de ingressar em uma Cooperativa Habitacional, para evitar problemas futuros, salientando-se que o cooperado poderá propor ação individual ou em conjunto, através de Ação Civil Pública, visando à adequação da Cooperativa às normas legais vigentes ou ao seu desligamento individual da Cooperativa.

(*) Membro do Ministério Público e especialista em Direito Penal pela FADUSP.